sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

Repressão nas ruas e blindagem na mídia

Política


Camila Lanes, presidente da UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), participava da manifestação dos estudantes da escola Maria José, na Bela Vista, no centro da capital paulista, quando a PM de Alckmin - que tentou forçar a desocupação que ocorria em protesto ao plano de fechar mais de 90 escolas no Estado - invadiu o local. O deputado federal Orlando Silva (PCdoB) precisou ligar para o governador paulista intercedendo pela liberdade da líder estudantil.

Por Cíntia Alves - Jornal GGN
Na noite de terça-feira (1), enquanto a oposição ao governo Dilma Rousseff (PT), liderada pelo PSDB do governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, obstruía a pauta de votação, a senadora petista Gleise Hoffmann pediu a palavra para informar que pela primeira vez desde a ditadura militar, uma dirigente estudantil havia sido presa pela Polícia Militar durante um protesto.
Camila Lanes, presidente da UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundaristas), participava da manifestação dos estudantes da escola Maria José, na Bela Vista, no centro da capital paulista, quando a PM de Alckmin - que tentou forçar a desocupação que ocorria em protesto ao plano de fechar mais de 90 escolas no Estado - invadiu o local. O deputado federal Orlando Silva (PCdoB) precisou ligar para o governador paulista intercedendo pela liberdade da líder estudantil.
Na edição impressa da Folha, nenhuma linha sobre este fato. O que aconteceu ao longo da terça-feira entre a PM e estudantes que repudiam o que a grande mídia chama de "reorganização do ensino" paulista, aliás, foi melhor registrado em vídeos e imagens que circularam na internet. Algumas, inclusive, mostram a PM abordando menores de idade com armas de fogo. Em outras, há agressões com cassetetes a meninos e meninas à luz do dia, indiscriminadamente.
No jornal, o assunto só é tratado na última página do caderno Cotidiano, com margem à seguinte leitura: a PM só reagiu a atos de vandalismos e à resistência dos estudantes. Folha usa imagens para reforçar a tese: põe, de um lado, a escola "alvo de depredação" em Osasco, pela manhã, ainda que seja desconhecida a autoria do ato; e de outro, a PM agindo para "dispersar" o movimento que fechava uma das principais vias de São Paulo, a Nove de Julho, "há mais de cinco horas".


O foco da matéria da Folha impressa sequer é sobre o "confronto" entre PM e estudantes. A saída, poupando o governo Alckmin de explicações sobre as cenas explícitas de violência, foi dar destaque a ações de promotores do interior para frear a "reorganização" das escolas.
Na linha-fina, algo incomum no jornalismo da Folha: a posição do governo é privilegiada. Alckmin vende que seu plano vai melhorar o ensino, e a Folha compra.
Nos últimos quatro parágrafos, Folha diz que o impasse, pela manhã, na escola Maria José, só ocorreu após pais e professores tentarem desocupar o local. "A PM usou gás de pimenta na ação". À noite, na Nove de Julho, a PM usou "bombas de efeito moral" e, de acordo com o relato do jornal, foi apedrejada.
Na edição impressa, nenhuma linha sobre a prisão de quatro manifestantes, dois deles menores de idade e já em liberdade nesta quarta (2). A versão online do jornal comporta um texto sobre a soltura, mas sem detalhes. Uma galeria com fotos do fechamento das vias centrais acompanha a matéria. Nela, aparece um PM aplicando um "mata-leão" em um manifestante. O jornal limita-se a descrever imagens e a informar que os policiais não quiseram comentar as ações de terça.
A Secretaria de Segurança e o gabinete de Alckmin foram poupados de comentar as cenas. O Painel da Folha desta quarta registra visita do tucano à redação, "onde foi recebido em almoço", "acompanhado de Marcio Aith, subsecretário de Comunicação do governo do Estado, e Isabel Salgueiro, assessora de imprensa". Folha blindou e brindou com Alckmin.

No concorrente, a mesma fórmula
Assim como a Folha, a edição impressa do Estadão também apresenta relatos da depredação em Osasco e conflito entre pais, professores e alunos na Bela Vista, além de destacar que os estudantes estão há dias obstruindo vias em São Paulo. Tudo isso num espaço tímido dentro do caderno Metrópole.


O jornal diferenciou-se do concorrente com informações atualizadas sobre as prisões e ao abrir espaço para o drama de pais e estudantes que participaram de manifestações sufocadas pela PM. Mas do mesmo modo que a Folha, poupou o governo Alckmin da violência explícita que se viu na internet.
São mais de 100 as escolas ocupadas em todo o Estado desde que Alckmin anunciou o fechamento de cerca de 90 unidades. Membro do Ministério Público alegam que o governador está aplicando uma "reforma administrativa" nas escolas para cortar gastos no ano que vem. A discussão, a depender da grande mídia, não avançou nem avançará muitos passos. Sequer sobre a interferência da PM nas ações que cabem à Secretaria de Educação. No máximo, Alckmin é criticado, vez ou outra, pela "falta de diálogo". Nada que impeça as promessas de melhorias de ocuparem o primeiro plano das reportagens.
Fonte - Blog do Miro (Altamiro Borges)   04/12/2015

Um eticamente desqualificado manda a julgamento uma mulher íntegra e ética

Política


É vergonhoso que a Câmara seja presidida por uma pessoa sem qualquer vinculação com a verdade e com o que é reto e decente. Manipula, pressiona deputados, cria obstáculos para o Conselho de Ética. Mais vergonhoso ainda é ele, cinicamente, presidir uma sessão na qual se decide a aceitação do impedimento de uma pessoa corretíssima e irreprochável como é a Presidenta Dilma Rousseff.

Leonardo Boff,
O Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, é acusado de graves atos delituosos: de beneficiário do Lava-Jato, de contas não declaradas na Suiça, de mentiras deslavadas como a última numa entrevista coletiva ao declarar que o Deputado André Moura fora levado pelo Chefe da Casa Civil Jacques Wagner a falar com a Presidenta Dilma Rousseff para barganhar a aprovação da CPMF em troca da rejeição da admissibilidade de um processo contra ele no Conselho de Ética. Repetidamente afirmou que a Presidenta em seu pronunciamento mentiu à nação ao afirmar que jamais se submeteria à alguma barganha política.
Quem mentiu não foi a Presidenta, mas o deputado Eduardo Cunha. Seu incondicional aliado, o deputado André Moura, não esteve barganhando com a Presidenta Dilma, como o testemunhou o ministro Jacques Wagner. Vale enfatizar: quem mentiu ao público brasileiro foi Euclides Cunha. Imitando Fernando Pessoa diria: Ele, mentiroso, mente tão perfeitamente que não parece mentira as mentiras que repete sempre.
É mentira que seu julgamento foi estritamente técnico. Pode ser técnico em seu texto, mas é mentiroso em seu contexto. O técnico nunca existe isolado, sem estar ligado a um tempo e a um interesse. É o que nos ensinam os filósofos críticos. Ele deslanchou o processo de impeachment contra a Presidenta exatamente no momento em que, apesar de todas as pressões e chantagens sobre o Conselho de Ética,soube que na votação perderia pois os três representantes do PT acolheriam a aceitação de um processo contra ele, o que poderia, depois, significar a sua condenação.
O que fez, foi um ato de vindita reles de quem perdeu a noção da gravidade e das consequências de seu ato rancoroso.
É vergonhoso que a Câmara seja presidida por uma pessoa sem qualquer vinculação com a verdade e com o que é reto e decente. Manipula, pressiona deputados, cria obstáculos para o Conselho de Ética. Mais vergonhoso ainda é ele, cinicamente, presidir uma sessão na qual se decide a aceitação do impedimento de uma pessoa corretíssima e irreprochável como é a Presidenta Dilma Rousseff.
Se Kant ensinava que a boa vontade é o único valor sem nenhum defeito, porque se tivesse um defeito, a boa vontade não seria boa, então Eduardo Cunha encarna o contrário, a má vontade, como o pior dos vícios porque contamina todos os demais atos, arquitetados para tirar vantagens pessoais ou prejudicar os outros.
Seu ato irresponsável pode lançar a nação em um grave retrocesso, abalando a jovem democracia, que, com vítimas e sangue, foi duramente conquistada. Não podemos aceitar que um delinquente político, destituído de sentido democrático e de apreço ao povo brasileiro, nos imponha mais este sacrifício.
Faço um apelo explícito ao Procurador Geral da República, ao Dr. Rodrigo Janot e a todo o Supremo Tribunal Federal: pesem, sotopesem e considerem as muitas acusações pendentes contra Eduardo Cunha nas áreas da Justiça. Estimo que há suficientes razões para afastá-lo da Presidência da Câmara e que venha a responder judicialmente por seus atos.
A missão desta mais alta instância da República, assim estimo, não se restringe à salvaguarda da constituição e à correta interpretação de seus artigos, mas junto a isso, zelar pela moralidade pública, quando esta, gravemente ferida, pode constituir uma ameaça à ordem democrática e, eventualmente, levar o país a um golpe contra a democracia.
Mais que outros cidadãos, são suas excelências, os principais cuidadores da sanidade da política e da salvaguarda da ordem democrática num Estado de direito, sem a qual mergulharíamos num caos com consequências políticas imprevisíveis. O Brasil clama pela atuação corajosa e decidida de vossas excelências, como ultimamente, tem demostrando exemplarmente.
Leonardo Boff, ex-professor de ética da UERJ
Fonte - Leonrado  Boff.com  03/12/2015

terça-feira, 6 de outubro de 2015

PGR pede ao Supremo abertura de inquérito para investigar senador Agripino Maia

Política

Arquivo/Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
De acordo com a PGR, o senador José Agripino Maia (DEM-RN) é acusado de receber dinheiro da empreiteira OAS nas obras da Arena das Dunas, em Natal

Andre Richter 
Repórter da Agência Brasil
A Procuradoria-Geral da República (PGR) pediu hoje (5) ao Supremo Tribunal Federal (STF) abertura de inquérito para investigar o senador José Agripino Maia (DEM-RN) pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. De acordo com a procuradoria, o parlamentar é acusado de receber dinheiro da empreiteira OAS nas obras da Arena das Dunas, em Natal, estádio construído para Copa do Mundo de 2014.
As suspeitas surgiram em depoimentos de investigados na Operação Lava Jato, mas a PGR pediu que o inquérito não seja remetido ao ministro Teori Zavascki, relator dos processos oriundos da operação no Supremo. Para a procuradoria, as acusações não estão relacionadas com os desvios de recursos da Petrobras, principal linha de investigação da Lava Jato.
Após ser informação do pedido de abertura de inquérito, o senador Agripino Maia disse que a acusação é absurda, inverídica e descabida. O parlamentar se colocou à disposição do Judiciário para prestar esclarecimentos. A Agência Brasil entrou em contato com a OAS, mas as ligações não foram atendidas.
Fonte - Agência Brasil   06/10/2015

quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Mudar a economia para sair da crise

Política

foto - ilustração
Mais de 100 profissionais, entre economistas, cientistas políticos, urbanistas, educadores, sanitaristas e outros, participaram da elaboração do documento, uma iniciativa conjunta do Brasil Debate, Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, Fórum 21, Fundação Perseu Abramo, Le Monde Diplomatique Brasil , Plataforma Política Social e Rede Desenvolvimentista.

Por Paula Quental, no site Brasil Debate
Existem caminhos para o Brasil sair da recessão e retomar o crescimento que não passam pelo ajuste fiscal comandado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy. Algumas dessas saídas, que “se insurgem contra a ditadura do pensamento único”, como definiu o presidente da Fundação Perseu Abramo, Marcio Pochmann, foram reunidas no documento “Por um Brasil Justo e Democrático”, lançado ontem, em São Paulo, na presença de lideranças de partidos políticos, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, sindicalistas, jornalistas e acadêmicos.
Mais de 100 profissionais, entre economistas, cientistas políticos, urbanistas, educadores, sanitaristas e outros, participaram da elaboração do documento, uma iniciativa conjunta do Brasil Debate, Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, Fórum 21, Fundação Perseu Abramo, Le Monde Diplomatique Brasil , Plataforma Política Social e Rede Desenvolvimentista.
Com a proposta de ser um texto em construção, que incentive na sociedade o debate sobre um projeto de desenvolvimento para o país, o documento tem como ponto de partida o entendimento de que o ajuste fiscal em curso assenta-se sobre um erro de diagnóstico da situação da economia brasileira. E que, a pretexto de combater a crise, pôr ordem nas contas fiscais e atrair investimentos é, ele próprio, o grande responsável por jogar o Brasil na recessão.
Para os coordenadores do documento, não só não é verdade que não existem alternativas para o país fora das medidas de austeridade, como esta opção é associada claramente aos interesses dos grandes bancos e fundos de investimento. “O documento se opõe ao terrorismo do ‘curto prazismo’ imposto pelo mercado financeiro à atuação dos governos”, resumiu Pochmann.
De acordo com Pedro Rossi, e coordenador do Brasil Debate, não havia no Brasil, em 2014, um cenário de crise que justificasse os sacrifícios impostos à população pela atual política econômica. “O documento faz um breve diagnóstico da situação do Brasil, que se contrapõe à leitura dominante; elaboramos a nossa própria narrativa sobre os fatos recentes”, disse.
Rossi explica que entre 2005 e 2011 o país viveu um círculo virtuoso de crescimento com distribuição de renda, aumento salarial, expansão do consumo e crédito. Mas que, ao contrário do que dizem os economistas liberais, o foco no consumo não se mostrou artificial, mas ajudou a consolidar o mercado interno e deu escala às empresas, “promovendo uma distribuição de renda funcional ao desenvolvimento brasileiro”.
Mas esse modelo, segundo ele, também teve suas “lacunas”, pois se centrou na inclusão social pelo consumo de bens privados e não de bens públicos, assim como teve seus deslizes, uma vez que não logrou uma coordenação de políticas publicas que fizessem avançar e diversificar a estrutura produtiva. “Fizemos uma modernização nos padrões de consumo da população sem uma modernização da estrutura produtiva que desse suporte”.
Hoje, as melhoras distributivas e os avanços sociais estão ameaçados por um ajuste recessivo, fiscal e monetário, e pelas reformas liberais que avançam no Executivo e Legislativo. “É uma irresponsabilidade fiscal jogar o país em recessão”, afirma o economista. “Responsabilidade fiscal é estimular o crescimento, preservar o emprego para aumentar a arrecadação”.

Riscos à Constituição de 1988
Para outro autor do documento, o coordenador da Plataforma Política Social Eduardo Fagnani, uma das piores consequências do discurso que defende o ajuste como única saída é a defesa da revisão dos direitos sociais estabelecidos pela Constituição de 1988. “Precisamos defender a Constituição de 1988; os economistas liberais sentenciam que o ajuste fiscal requer rever conquistas da Constituição”, alertou.
Segundo ele, para avançar nas conquistas sociais, enfrentar a desigualdade de renda e patrimônio, “uma das mais elevadas do mundo”, e fazer o país voltar a crescer, é necessário flexibilizar a política econômica baseada no velho consenso do tripé macroeconômico (metas de inflação, câmbio flutuante e metas de superávit primário). “Até o FMI reconhece que essa política precisa ser flexibilizada, vários países já flexibilizaram, mas mexer com o tripé aqui no Brasil é visto como heresia”.
Para o diretor-presidente da Carta Maior e membro do grupo executivo do Fórum 21, Joaquim Palhares, todas essas questões precisam ser discutidas pela sociedade. “Há uma perplexidade, as pessoas não estão entendendo o que está acontecendo. É preciso esclarecer o momento que estamos vivendo”, disse, lembrando que, por causa do discurso único adotado pela grande imprensa, muitas informações não chegam à população, ou chegam pela metade.
Silvio Caccia Bava, diretor e editor-chefe do Le Monde Diplomatique Brasil, lembrou que “enfrentar o discurso de que o ajuste é necessário, mostrando que há alternativas e que o neoliberalismo não trata do futuro do país, não almeja a construção de um país mais igual, mais justo, mais democrático”, é uma das funções do documento.

Para mudar já
Com cerca de 140 páginas, o documento se divide em dois volumes (“Mudar para sair da crise – alternativas para o Brasil voltar a crescer” e “O Brasil que Queremos – subsídios para um projeto de desenvolvimento nacional”) e traz também sugestões de medidas a serem tomadas no curto prazo que poderão contribuir para retirar o país da crise.
Guilherme Mello, representante da Rede Desenvolvimentista, enumerou algumas delas. Por exemplo, estabelecer “bandas” para a meta de superávit fiscal, já adotadas por diversos países, como forma de evitar expectativas negativas diante de quedas de receita ou gastos inesperados.
Outras propostas práticas são: retirar parte ou a totalidade dos investimentos do cálculo da meta do superávit primário (outra iniciativa posta em prática por vários outros países); passar a calcular a inflação pelo núcleo de preços (deixando de usar o IPCA, que inclui produtos e serviços com preços determinados por fatores externos, que não são alvo de controle da política monetária); regulamentar o mercado cambial observando fluxos de capital e operações com derivativos e reduzir a taxa de juros, cuja alta não se justifica em períodos de recessão e quando a inflação é causada principalmente por custos e não por demanda.
Entre os especialistas que contribuíram para a construção do documento, e que também estiveram presentes ao lançamento, estão Ana Fonseca, Antonio C. Lacerda, Clemente Ganz Lúcio, Wolfgang Leo Maar.

Esperança e Mudança
Ao anunciar o lançamento do documento, Pochmann chegou a citar como inspiração o texto “Esperança e Mudança”, lançado pelo PMDB em 1982, e que até hoje é lembrado como um dos programas desenvolvimentistas mais sólidos já elaborados, que deu importantes contribuições para a Constituição de 1988.
Um dos seus autores, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, ex-presidente do Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o Desenvolvimento, também contribuiu para a redação de “Por um Brasil Justo e Democrático”. Ele resumiu as expectativas em relação ao documento: “Na minha forma de ver, os economistas aqui são apenas consultores, a sociedade é que tem que levar isso a cabo. Sem construção social, não vai acontecer nada. Só acredito no movimento da sociedade”.
Estiveram ainda presentes ao lançamento, entre outros, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), Tarso Genro, ex-governador do Rio Grande do Sul pelo PT, João Pedro Stédile, líder do MST, e Roberto Amaral, ex-presidente do PSB.
Fonte - Blog do Miro   29/09/2015

sábado, 12 de setembro de 2015

Os “revoltados” da sonegação. R$ 150 bilhões em um só ano

Política


Um ralo que toma do dinheiro público, em uma semana, mais do que a ladroeira dos Youssefs e Paulo Roberto Costa em anos e anos de safadezas.

Por Fernando Brito
O Estadão dá, agora à noite, manchete sobre a “polêmica” causada (segundo o jornal) entre os advogados tributários pela tardia decisão da receita Federal de apressar a cobrança de impostos devidos por 400 grandes contribuintes e que somariam R$ 20 bilhões.
Pela média, uma dívida de R$ 50 milhões “por cabeça”, com média de três a cinco anos, com recursos já recusados.
Há dias, este Tijolaço foi um dos poucos lugares onde se noticiou a mudança no critério de fiscalização de impostos, inclusive com meu hilário exemplo pessoal, de ter tomado tempo e dinheiro do Fisco com uma autuação – que levou quatro anos para ser revista, porque errada – que somava fantásticos seis centavos, ou 11 centavos, com multa e juros de mora.
Alegam que a Receita “atropelou” as defesas dos grandes contribuintes.
Compare o querido amiga e a distinta leitora o tratamento que tem o cidadão comum pelo “Leão” nas famosas “malhas finas”.
Sem contar que o grande contribuinte não tem a menor dificuldade de impugnar judicialmente a cobrança, coisa que para nós, mortais, é inviável, porque mesmo diante de uma cobrança que consideramos injusta, temos de pensar 100 vezes antes de decidir gastar com advogado mais do que está sendo cobrado.
Dá-se, então, um caso como o da autuação do Itaú em “apenas” R$ 18,7 bilhões em agosto de 2013, algo que chega hoje (se é que o valor divulgado refere-se à data da notícia, e não data anterior) a R$ 23,3 bilhões, corrigido pela Selic, que indexa dívidas tributárias.
Reparem a desproporção e o tamanho da sonegação fiscal – e só daquela que é “pega” – no Brasil: só no primeiro semestre deste ano foram apurados R$ 75 bilhões em fuga de impostos, quase R$ 22 bilhões a mais que um ano antes. “Apesar da crise”, é claro, que fez se reduzir, em termos reais, o recolhimento de impostos.
Deste valor, informou também o Estadão, “75% referem-se a grandes contribuintes, com receita bruta superior a R$ 150 milhões”.
Quer dizer, R$ 56 bilhões devidos por gente de alta, altíssima bufunfa no bolso.
Se apenas isso, apenas isso, se repetir no segundo semestre, temos R$ 112 bilhões, suficiente para fazer os “sonhados” 0,7% do PIB de superavit fiscal para 2016 ( R$ 43,8 bilhões) não apenas serem alcançados mas dobrados e quase triplicados.
E, como as fiscalizações estão, na maioria, ainda em curso, em meio a análise, o valor mais do que dobrará.
Ano passado, foram R$ 151 bilhões em autuações, registram os dados oficiais da Receita.(http://idg.receita.fazenda.gov.br/dados/resultados/fiscalizacao/arquivos-e-imagens/12015_03_05-plano-anual-da-fiscalizacao-2015-e-resultados-2014.pdf)
R$ 144 bilhões lançados sobre 14.298 pessoas jurídicas. E R$ 7 bilhões lançados sobre 351.534 pessoas físicas. E olhem que destes R$ 7 bilhões, quase um terço (R$ 2,1 bi) foram sobre proprietários ou dirigentes de empresas, que deixaram de pagar sobre, principalmente, venda ou permuta de ações ou cotas de participação societária.
A sonegação – repito, a que é detectada e objeto de autuação fiscal – atinge estes valores monstruosos, mas não chama a atenção de nossa imprensa, que sai em defesa do “contribuinte”, usando a multidão de pessoas que, por erro ou desencontro numa despesa médica irrisória cai na “malha fina” como colchão para a grossa fuga de impostos que não está, de forma alguma, no pequeno contribuinte.
Um ralo que toma do dinheiro público, em uma semana, mais do que a ladroeira dos Youssefs e Paulo Roberto Costa em anos e anos de safadezas.
Sem Moro, sem “moralistas de plantão”, sem Fábio Júnior, sem Revoltados Online, sem editoriais.
Sem vergonha.
Fonte - Tijolaço  11/09/2015

Os bancos preparam a próxima crise global

Economia

Imagem: Sj J,Bankers, 2010
Como a aristocracia financeira recuperou poderes e regalias que levaram ao terremoto de 2008. Por que, ao poupar este setor, políticas como “ajuste fiscal” brasileiro abrem caminho para novo desastre

Por Susan George 
Tradução: Gabriela Leite 
Sempre otimista, não acreditei que os bancos sairiam da crise de 2007 a 2008 mais fortes que antes, sobretudo em termos políticos. É verdade que alguns pagaram multas que os fizeram cambalear — um total de 178 bilhões de dólares para os bancos norte-americanos e europeus — mas consideram que tais desembolsos são “o preço de fazer negócios”. Nenhum líderes do setor que quebrou a economia mundial passou uma só noite na prisão, nem teve que pagar, pessoalmente, uma única multa.
Ainda não superamos os efeitos do terremoto financeiro vivido em 2007-2008, mas os políticos e os próprios banqueiros já estão preparando o cenário para a próxima crise. Estudos matemáticos mostraram a densa teia interconectada dos atores financeiros mundiais, na qual a falha de um deles poderia desencadear o colapso de todos. Nos colocaram no fio da navalha, e temos boas razões para ser pessimistas:
– Os governos e as instituições financeiras internacionais não demonstraram nenhuma intenção de regular os bancos, o que nos expõe ao perigo de ter que suportar uma repetição da jogada. Os bancos e os banqueiros não só são grandes demais para falir — ou para ser presos –, mas também para ser desafiados. Por isso, permitem-se fazer o que lhes dê vontade.
– A adoção de dispositivos de segurança no setor financeiro foi sistematicamente sabotada. Não se produziu a separação necessária entre os bancos comerciais e os bancos de investimento (o que impediria que o dinheiro dos depositantes continuasse a ser usado para especular). Durante mais de sessenta anos, a lei norte-americana Glass-Steagull, aprovada durante o New Deal do governo Roosevelt separou-os, protegendo o sistema financeiro norte-americano. Foi revogada, em 1998, sob o mandato do presidente Bill Clinton — com um grande empurrão de seu secretário do Tesouro, Robert Rubin, ex-executivo do banco Goldman Sachs. Foi necessário menos de uma década para produzir-se a quebra devastadora do Lehman Brother e do mercado. Os políticos não atendem a razões, mas sim ao lobby bancário. Por isso, as exigências de reservas (capital) dos bancos continuam baixos demais. Não se aprovou nenhum novo imposto sobre as transações financeiras. Um imposto debatido por onze paízes da União Europeia ainda está em debate.
– Os volumes diários de transações com derivativos e moedas cresceram 25% ou 30% em comparação com os níveis de antes da crise, e somam trilhões a cada dia. As operações anuais totais com derivados somam em torno de cem vezes o Produto Mundial Bruto. O surgimento de transações automatizadas, impulsionadas por algorítimos, move este crescimento, mas até as máquinas e os nerdsmatemáticos podem cometer erros perigosos.
– Grandes quantidades de empréstimos convertidos em bônus de risco poderiam inundar uma vez mais as carteiras de investidores instutucionais. Desta vez não estariam associados às hipotecassubprime, mas a lotes de outras categorias de dívida, como os empréstimos a estudantes ou consumidores.
– Em 2008, a especulação desenfreada nos mercados de matérias primas causou uma dramática alta dos preços dos alimentos, acrescentando 150 milhões de pessoas às listas dos famintos mundiais. Estas cifras não se repetirão nem nesse ano, nem no próximo: os preços dos grãos despencaram e 150 trilhões de dólares procedentes de Wall Street foram retirados desses mercados nos últimos dois anos. Contudo, outras leis protetoras do New Deal também foram revogadas e os mercados poderão mais uma vez ser alvo de apostas sem limites, quando as mudanças climáticas e a falta de alimento fizerem com que sejam rentáveis.
– Os paraísos fiscais triunfaram. Eles não beneficiam apenas o 1% mais rico. Especializaram-se também na evasão fiscal corporativa. As maiores corporações deixaram de pagar os impostos que lhes correspondem. Por exemplo, as empresas francesas sonegam anualmente de 60 a 80 bilhões de dólares. As corporações beneficiam-se de serviços públicos como a polícia e os bombeiros, a energia, a água, o saneamento, o transporte, a saúde, a educação e a formação para seu pessoal, e o Estado de direito, mas não contribuem para mantê-los, de maneira que estes se deterioram. Quem perde são os cidadãos e cidadãs, e a rede de infraestrutura. O escândalo Luxleaks – que desmascarou a evasão fiscal de mais de 300 empresas — demonstra que os Estados-membros da União Europeia fazem intencionalmente vistas grossas, com a cumplicidade das quatro grandes “agências de risco”, quando as empresas transferem contilmente seus lucros para Luxemburgo, onde quase não pagam impostos. Os paraísos fiscais das Ilhas Britânicas também contribuem para essa prática. Estima-se que 25% ou mais do faturamento dos maiores bancos da União Europeia está em “centros off-shore”; ninguém conhece ao certo esta cifra.
– Pesquisas realizadas pelo Banco Central Europeu sobre os 130 maiores bancos da União Europeia descobriram que estes não apoiam a economia real — onde as pessoas vivem, trabalham, produzem e consomem. As pequenas e médias empresas da União Europeia oferecem 80% ou 90% de todo o emprego disponível, mas continuam tendo muitos problemas para receber empréstimos. Desde 2008, os bancos endureceram suas condições de concessão de crédito. O Finance Watch – um think tank progressista de Bruxelas — afirma que só 28% de toda atividade bancária vai para a economia real; o que sobra infla o setor dos produtos financeiros que multiplicam o dinheiro sem passar por fases tão “incômodas” como a produção e a distribuição…
– É verdade que os Estados Unidos têm vivido crescimento econômico e criação de emprego, porém mais de 90% do valor de tal crescimento tem sido abocanhado pelo 1% mais rico. O desemprego europeu continua crescendo, e em vez de crescer, a União Europeia escorrega rumo à deflação.
– Já em 2011, os lucros dos bancos norte-americanos haviam chegado aos níveis recorde de antes da crise. E ainda antes, em 2009, os nove maiores bancos desse país distribuíam gratificações de um milhão de dólares ou mais, a mais de cinco mil banqueiros e operadores financeiros, usando para isso o dinheiro público dos empréstimo que receberam dos Estados. Ao menos 5 bilhões de dólares provenientes do dinheiro dos contribuintes norte-americanos foram para indivíduos da indústria financeira. Seus colegas britânicos receberam 20 bilhões de dólares por meio de gratificações em 2010 e 2011, e os banqueiros franceses receberam outro tanto.
– As robustas gratificações contribuem para o grande salto adiante da desigualdade. São conhecidas as comparações chocantes entre a parte da riqueza mundial que é apropriada pelos multimilionários e o que sobra para o resto do mundo. Estão sintetizadas num relatório da Oxfan ou nos informes sobre a riqueza mundial que falam sobre as alturas douradas, onde moram não o um por cento — pobres perdedores! — mas um em cada dez milhões.
– A lista de bilionários da Forbes, de 2014, enumera os 1542 terráqueos que ultrapassaram a marca, com um volume total de 6,5 bilhões de dólares. A desigualdade não é obscena em termos monetários. Em Desigualdade: uma análise da (in)felicidade coletiva,Richard Wilkinson e Kate Pickett demonstraram de maneira indiscutível que a desigualdade tem correlação necessária com todos os fenômenos sociais desagradáveis e custosos, de doenças à violência, à obesidade e as populações carcerárias. Mas as finanças estão organizadas agora de tal maneira que ao chegar ao status de bilionário, é muito difícil perdê-lo.

Recompensas, recompensas
Os banqueiros aprenderam também como organizar as instituições internacionais para que estas os recompensem tanto nos momentos bons como nos maus, por investimentos financeiros geniais ou desastrosos. Desta maneira, governos da zona do euro como Alemanha e França trazem dinheiro ao Mecanismo Europeu de Estabilidade Financeira; este dá dinheiro ao governo grego (irlandês, espanhol…) que, por sua vez, o entrega aos bancos gregos (irlandeses, espanhois…) com a intenção de que estes devolvam os empréstimos recebidos dos bancos franceses e alemães.
A maioria das pessoas não se dá conta que os enormes “empréstimos” concedidos à Grécia pela “Troika” (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional) entre 2010 e 2012 não se destinaram a “ajudar os gregos”, mas sim a canalizar dinheiro aos bancos que haviam comprado títulos gregos. E por que compraram? É uma boa pergunta: porque estes valiam em euros, mas pagavam juros mais altos, por exemplo, que os títulos alemães, igualmente denominados em euros.
O trabalho da Troika é, portanto, garantir que se devolva o dinheiro aos bancos, desde os planos de “regate” sejam associados a condições drásticas da austeridade. Os bancos podem perder algo em seus investimentos nos países do Sul da Europa ou da periferia — mas não no nível em que isso ocorreria sem a porta giratória da Troika.
Os povos — que não criaram a crise — devem, contudo, sofrer com ela. Até certo ponto, isso pode ser medido em fome crescente, fechamento de hospitais e escolas, violência e migração dos jovens. Mas as verdadeiras consequências para incontáveis seres humanos que não têm responsabilidade pelos problemas econõmicos não podem ser quantificadas. Sustento: minha afirmação de que os bancos aprenderam que podem fazer o que quiserem não era um recurso retórico…
E chegamos ao ponto em que o leitor diz: “sim, mas o que podemos fazer?” Em geral, as respostas são conhecidas, e muitas delas consistem em fazer o contrário do que se resumiu acima. Separar os bancos comerciais dos de investimento, cobrar imposto das instituições financeiras, proscrever os paraísos fiscais, obrigar Luxemburgo a desmantelar sua proteção às empresas sonegadoras, negar-se a assinar os novos acordos de “livre” comércio.
Mudar as regras do Banco Central Europeu (BCE), que não empresta aos países, mas apenas aos bancos privados. Estes pedem créditos ao BCE a menos de 1% de juros ao ano, para em seguida emprestar os mesmos recursos aos países com os maiores juros possíveis — às vezes mais de 6% — o que constitui outro presente à banca. O BCE deveria emprestar diretamente aos países, cobrando os mesmos 1% ou menos, e os governos europeus deveriam poder emitir títulos em euros.
As políticas de “austeridade” devem ser descartadas, porque não funcionam, nem humana nem economicamente. Os europeus do norte entendem isso: a palavra em alemão para dívida é Schuld, que significa também pecado ou culpa; mas a crise persistente não tem a ver com moralidade. Necessitamos de menos golpes no peito (o dos outros) e mais economia inteligente. Nas palavras de um economista alemão que escrevia no Financial Times: “Existem dois tipos de economistas alemães: os que não leram Keynes e os que não entenderam.”
É preciso lembrar primeiro que a dívida os países não se parece, em absoluto, com a de uma família. Na verdade, ao longo da história, a maior parte da dívida soberana era perdoada; em todo caso, como disse o economista e acadêmico norte-americano Paul Krugman: “é preciso vigiar os fluxos, não as ações.”
Enquanto os países continuarem obrigados ao pagamento de juros elevados, terão dúvidas eternas. As nações não desaparecem. A Grécia, por exemplo, tem um superávit orçamentário, quando levam-se em conta apenas a arrecadação de tributos e os investimentos e despesas não-financeiras. Deveria estar qualificada para pagar juros de 1% do ano. O país deveria também reduzir drasticamente seu orçamento militar, tributar a igreja — o maior proprietário de terrenos e imóveis — e como disse o partido governante Syriza, “perseguir a oligarquia”.
Se a próxima crise for de fato deflagrada, será imensa e mortalmente perigosa para as pessoas comuns, que poderiam perder sua poupança, seguros, aposentadorias e mais. Não estou propondo que se criem refúgios antiaéreos ao estilo de 1950, construam-se depósitos de alimentos e se autorize a posse de uma arma por casa — mas não faria mal começar a desenvolver sistemas sociais mais resistentes e uma autoconfiança maior. As pessoas trabalham bem quando cooperam entre si, e o fazem instintivamente ou por necessidade quando têm que enfrentar um colapso econômico, como fizeram os argentinos há quinze anos ou fazem os gregos hoje. Organizam cantinas populares, hortas comunitárias, clínicas de saúde solidárias, creches, moedas sociais, soluções habitacionais e assim por diante.
Sobretudo, precisamos enfrentar a mortífera ideologia neoliberal que contaminou o pensamento e a ação, enquanto os bancos podem fazer o que lhes der na telha.
Fonte - Outras Palavras  10/09/2015
(http://outraspalavras.net/author/redacaooutraspalavras/)

quarta-feira, 9 de setembro de 2015

Que os super-ricos paguem a conta

Política

foto montagem - ilustração
Os 13,5 milhões que ganham até 5 salários mínimos. Se deixassem de pagar IR, a perda seria de mais ou menos 1% do total arrecadado pela receita. Só. E gastariam esse dinheiro, provavelmente, em alimento, roupa, escola, algum “luxo popular”.

Por Reginaldo Moraes
No site Brasil Debate
Faz alguns anos, a Receita Federal divulga os grandes números das declarações de renda. Neste ano, divulgou dados que nunca divulgara. E com isso ficamos sabendo, número por número, coisas estarrecedoras que só podíamos deduzir, observando o comportamento de nossos ricaços. Veja alguns destaques:

Quantas pessoas físicas fazem declaração?

Quase 27 milhões.

Qual é o “andar de baixo”?

Os 13,5 milhões que ganham até 5 salários mínimos. Se deixassem de pagar IR, a perda seria de mais ou menos 1% do total arrecadado pela receita. Só. E gastariam esse dinheiro, provavelmente, em alimento, roupa, escola, algum “luxo popular”.

Quais são os andares de cima?

São três andares:

1. Os que ganham entre 20 e 40 salários mínimos. Correspondem a mais ou menos 1% da população economicamente ativa. Podem ter algum luxo, pelos padrões brasileiros. Mas pagam bastante imposto.

2. Tem um andar mais alto. Os que ganham entre 40 e 160 SM representam mais ou menos 0,5% da população ativa. Já sobra algum para comprar deputados (ou juízes).

3. E tem um andar “de cobertura”, o andar da diretoria, da chefia. A nata. A faixa dos que estão acima dos 160 SM por mês. São 71.440 pessoas, que absorveram R$ 298 bilhões em 2013, o que correspondia a 14% da renda total das declarações. A renda anual média individual desse grupo foi de mais de R$ 4 milhões. Eles representam apenas 0,05% da população economicamente ativa e 0,3% dos declarantes do imposto de renda. Esse estrato possui um patrimônio de R$ 1,2 trilhão, 22,7% de toda a riqueza declarada por todos os contribuintes em bens e ativos financeiros. Pode estar certo de que são estes que decidem quem deve ter campanha financiada. Podem comprar candidatos e, também, claro, sentenças de juízes.

Quem sustenta o circo? Quem mais paga IR?

A faixa que mais paga é a do declarante com renda entre 20 e 40 salários mínimos, que se pode chamar de classe média ou classe média alta.

Quem escapa do leão?

O topo da pirâmide, o grupo que tem renda mensal superior a 160 salários mínimos (R$ 126 mil). As classes média e média alta pagam mais IR do que os verdadeiramente ricos.

Em 2013, desses 72 mil super-ricos brasileiros, 52 mil receberam lucros e dividendos – rendimentos isentos. Dois terços do que eles ganham sequer é taxado. São vacinados contra imposto. Tudo na lei, acredite. A maior parte do rendimento desses ricos é classificada como não tributado ou com tributação exclusiva, isto é tributado apenas com o percentual da fonte, como os rendimentos de aplicações financeiras.

Em 2013, do total de rendimentos desses ricaços, apenas 35% foram tributados pelo Imposto de renda pessoa física. Na faixa dos que recebem de 3 a 5 salários, por exemplo, mais de 90% da renda foi alvo de pagamento de imposto. Em resumo: a lei decidiu que salário do trabalhador paga imposto, lucro do bilionário não paga.

O que isso exige da ação política?

Quando a classe trabalhadora e suas organizações se enfraquecem, burocratizam ou recuam, deixam a ideologia e os sentimentos da classe média sob o comando da classe capitalista. Mais ainda, da sua ala mais reacionária. Pior ainda: a direita conquista até mesmo o coração dos trabalhadores que são tentados a se imaginar como “classe média”.

Na história do século 20, o resultado disso foi a experiência do fascismo, em suas múltiplas formas e aparições.

Nos últimos anos, os bilionários brasileiros e seus cães de guarda na mídia perceberam que podiam conquistar o ressentimento da classe média para jogá-la contra os pobres, os nordestinos, os negros, tudo, enfim, que se aproximasse dos grupos sociais que fossem alvo de políticas compensatórias, de redistribuição. E contra governos e partidos que tomassem essa causa.

E a esquerda, de certo modo, assistiu a essa conquista ideológica sem ter resposta. Uma resposta política: a criação de movimentos reformadores que fizessem o movimento inverso, isto é, colocassem essa classe média contra os altos andares da riqueza. Nós não soubemos fazer isso. Talvez pior: acho que nem tentamos fazer isso.

Aparece agora essa urgente necessidade e a providência divina, travestida de Receita Federal, nos traz uma nova chance.

Já sabíamos que os brasileiros mais pobres pagam mais impostos, diretos e indiretos, do que os brasileiros mais ricos. Sabemos que todos pagamos imposto sobre propriedade territorial urbana – o famoso IPTU. E conhecemos o estardalhaço que surge quando se fala em taxar mais os imóveis em bairros mais ricos.

Mas sabemos coisa pior: grandes proprietários de imóveis rurais não pagam quase nada. Sobre isso não tem estardalhaço. É assim: se você, membro da “classe média empreendedora” passeante da Avenida Paulista, tem uma loja, oficina ou restaurante de self service, paga um belo IPTU. Se você fosse um grande proprietário rural (como os bancos e as empresas de comunicação), seu mar de terras com uma dúzia de vacas não pagaria ITR. Ah, sim, teria crédito barato.

Tudo isso já é mais ou menos sabido e merece reforma. Mas ainda mais chocante é o que se chama de “imposto progressivo sobre a renda”, que agora sabemos que é ainda menos progressivo do que imaginávamos.

Faz algum tempo escrevi um artigo dizendo que a Receita Federal deveria concentrar sua fiscalização na última faixa dos declarantes pessoa física, responsável por 90% do IR. Se o resto simplesmente deixar de pagar não vai fazer tanta diferença. Além disso, a faixa mais alta é aquela que menos recolhe na fonte e a que mais tem “rendimentos não tributáveis” e de “tributação exclusiva”, isto é, rendimentos derivados de investimentos, não de pagamento do trabalho.

Fui injusto ou impreciso, moderado demais. A Receita e os legisladores podem economizar mais tempo do que eu supunha. Basta que prestem atenção em 100 mil contribuintes, do total de 26 milhões. Essa é a mina. Se conseguir que eles paguem o que devem e se conseguir que eles percam as isenções escandalosas que têm, posso apostar que teremos mais dinheiro do que os ajustes desastrados e recessivos do senhor ministro da Fazenda.

O que isso significa para o que chamamos de esquerda – partidos, sindicatos, movimentos sociais? Sugiro pensar em um movimento unificado com uma bandeira simples: que esses 100 mil ricaços paguem mais impostos e que deem sua “contribuição solidária” para reduzir a carga fiscal de quem trabalha. É preciso traduzir essa ideia numa palavra de ordem clara, curta e precisa, mobilizadora. E traduzi-la numa proposta simples e clara de reforma, cobrada do governo e do Congresso. A ideia é simples: isenção para os pobres, redução para a classe média, mais impostos para os ricaços.

Talvez essa seja uma boa ideia para fazer com que a “classe média” que atira nos pobres passe a pensar melhor em quem deve ser o alvo da ira santa. Afinal, milhares e milhares de pagadores de impostos foram para as ruas, raivosos, em agosto, enquanto os nababos que de fato os comandam ficavam em seus retiros bebendo champanhe subsidiada.

Os passeadores da Avenida Paulista são figurantes da peça, eles não sabem das coisas – os roteiristas e produtores nem deram as caras.

Em que rumo os partidos e movimentos populares devem exigir mudanças?

1. É justo e perfeitamente possível isentar todo aquele que ganha até 10 salários mínimos. Não abala a arrecadação se cobrar um pouco mais dos de cima.

2. É necessário e legítimo criar faixas mais pesadas para os andares mais altos. Mas não é suficiente.

3. É preciso mudar as regras que permitem isenção e desconto para lucros e dividendos.

4. É preciso e é legítimo mudar as regras para os pagamentos disfarçados, não tributáveis, em “benefícios indiretos”. A regra tem sido um meio de burlar a taxação.

5. É preciso e é legítimo mudar as regras de imposto sobre a propriedade territorial. A classe média estrila com o IPTU. Mas deveria é exigir cobrança do ITR.

6. É preciso ter um imposto sobre heranças. Com isenção para pequenos valores e tabela progressiva.
Fonte - Blog do Miro (Altamiro Borges)  09/09/2015

terça-feira, 11 de agosto de 2015

ACM Neto e os cactos antimendigos

Política

Socialista Morena
A técnica medieval supera todas as iniciativas já tomadas no País contra os sem-teto de que já ouvifalar. Passando pelo Vale do Canela, um dos locais onde os cactos foram plantados, percebi que os mendigos continuam dormindo ali, só que agora tentando manter distância de seus “colegas” espinhosos.

Por Cynara Menezes
No blog Socialista Morena
O prefeito de Salvador, Antonio Carlos Magalhães Neto, do DEM, resolveu inovar nas técnicas de tortura que os políticos de direita inventam no Brasil para impedir moradores de rua de dormirem embaixo dos viadutos: está mandando plantar cactos nos locais procurados pelos mendigos para se abrigar à noite. A técnica medieval supera todas as iniciativas já tomadas no País contra os sem-teto de que já ouvi falar. Passando pelo Vale do Canela, um dos locais onde os cactos foram plantados, percebi que os mendigos continuam dormindo ali, só que agora tentando manter distância de seus “colegas” espinhosos.
Segundo a prefeitura, no entanto, trata-se apenas de “paisagismo” e uma “opção estética”. O diretor de Áreas Verdes, Parques e Jardins, Uelber Reis, disse ao blog que, em muitos lugares, os cactos já existiam, mas os que foram plantados agora não tiveram como intenção impedir o abrigo dos sem-teto. “De maneira nenhuma. Nossa visão é de que mendigo não tem que dormir debaixo de viaduto, deve ser reintroduzido à sociedade. Temos vários programas sociais e abrigos. Não existe relação entre os cactos e os moradores de rua”, garantiu. “A escolha do cacto foi feita porque é uma planta que resiste bem ao sombreamento e achamos que ficou bonito.”
Não é a primeira vez que governantes de direita “resolvem” o problema dos moradores de rua expulsando-os dos vãos embaixo dos viadutos. Em São Paulo, quando José Serra, do PSDB, era prefeito, foram feitas rampas antimendigos: o piso sob os viadutos da cidade foi revestido com cimento áspero, tornando-o incômodo para quem tentasse dormir ali.
Em Belo Horizonte, na administração do atual prefeito Marcio Lacerda, do PSB, nova denúncia de higienismo contra os sem-teto: a administração mandou colocar pedras pontiagudas sob os viadutos da cidade. O caso foi explorado pelo opositor de Lacerda, Patrus Ananias, do PT, em vídeo divulgado na campanha eleitoral de 2012. Ainda assim, o prefeito foi reeleito.
No Rio de Janeiro, o prefeito Eduardo Paes, do PMDB, também recorreu às pedras pontiagudas para repelir os moradores de rua dos viadutos da cidade. A prefeitura chama o suplício eufemisticamente de “jardim de pedras”.
Em Salvador, os movimentos sociais estão de olho nas tentativas de gentrificação da cidade. Esta semana, os barraqueiros do tradicional Mercado do Peixe, no Rio Vermelho, foram expulsos do local, que será reformado. A prefeitura promete realocá-los em outro lugar, mas ainda não disse onde.
Fonte - Blog do Miro  11/08/2015

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Aldir Blanc detona FHC e "Aócio"

Política


 Em sua coluna de domingo (31) no jornal "O Globo" - que ainda resiste, mas deve causar calafrios nos chefetes do veículo -, ele não poupou críticas a FHC, que sempre engavetou as denúncias de corrupção no seu triste reinado, ao truculento governador paranaense "Bato Racha" e ao cambaleante Aécio Neves.

Por Altamiro Borges
Com seu estilo ácido, o compositor Aldir Blanc, um dos maiores gênios da música popular brasileira, voltou a detonar FHC, "Aócio" e outros tucanos de alta plumagem. Em sua coluna de domingo (31) no jornal "O Globo" - que ainda resiste, mas deve causar calafrios nos chefetes do veículo -, ele não poupou críticas a FHC, que sempre engavetou as denúncias de corrupção no seu triste reinado, ao truculento governador paranaense "Bato Racha" e ao cambaleante Aécio Neves. Este último esbravejou recentemente que Dilma Rousseff é covarde. "Minha opinião é diferente: covarde é marmanjo que, entupido de pó, bate em mulher". Vale conferir o petardo:
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Tatu subiu no pau
Nunca se apurou e se prendeu tanto, o que não acontece quando os criminosos pertencem à tucanagem
O gatuno e atiçador dos cães assassinos da ditadura militar J. M. Marin foi preso na Suíça. Por que não aqui? A resposta cabe à Polícia Federal, Receita e outros órgãos complacentes diante da corrupção de direita. J. Hawilla, da Traffic (que não se perca pelo nome), também está entre os envolvidos e já foi confessando geral. Só no caso dele, a roubalheira pode chegar, por baixo, a quase meio bilhão de reais. Será que os outros membros dessa quadrilha de trafficantes serão presos no Brasil?
Aos 68 anos, vi a tal foto que vale por mil, ou bilhões de palavras: no evento de 1º de Maio da Força (faz força, Paulinho, que a sujeira sai!), quase abraçadinhos sob o pé do flamboayant, Dudu Cucunha e Anéscio Neves, o canibal do avô, cochichavam. Cucunha enfiou o indicador da mão direita na deep narina, enquanto fazia Aócio rir feito Mutley, o cachorro do Dick Vigarista. A chopeidança primou pelos discursos que pediam a cabeça da Dilma. Por isso, um dos seus aliados estava lá, quase osculando o Abóstulo do Terceiro Turno.
De vomitar. Aócio chamou Dilma de covarde por ter evitado pronunciamento na telinha. Está exercendo seu direito de livre expressão em uma democracia. Minha opinião é diferente: covarde é marmanjo que, entupido de pó, bate em mulher. Outra frase jocosa foi de FHC I e II: “Nunca se roubou tanto nesse país”. Não, Fernandinho. Nunca se apurou e se prendeu tanto, o que não acontece quando os criminosos pertencem à tucanagem.
Taí o mensalão do Azeredo, 20 anos de esbórnia nos trens metropolitanos de São Paulo, escândalos nas privatizações selvagens etc. que não me deixam mentir. Empreiteiros corruptos estão sendo soltos. Banqueiro condenado a 21 anos de cadeia tem a sentença anulada, todos em casa, aliviados, preparando o próximo golpe. A balança da Cegueta precisa de um ajuste fiscal...
O cenário pornopolítico foi dominado pelo massacre dos professores no Paraná. Depois do “prendo e arrebento”, temos Bato Racha, vulgo Beto 9.9 em violência na escala Richa. Bato Racha levou nove dias para se arrepender, e com a frase mais - desculpem, não há outra palavra - escrota que pode brotar da boca de um covarde: “Machucou mais a mim...” O perdigoto não agradou, Racha deu ré e agora aprova de novo a pancadaria sanguinolenta, balas na cara, bombas, pitbulls... Foi um tremendo rasgo na Cortina de Penas do bom-mocismo tucano. Eles são aquilo mesmo. Bato Racha mandou fitas para jornalistas comprovarem a ação de “elementos infiltrados” no protesto. Ninguém encontrou um único agente provocador. Bato Racha é também um deslavado mentiroso.
Estão soltas no pedaço as feras do CCE (Comando de Caça aos Esquerdistas). Parecia que o senadô Lulu Menopausa Nunes dedaria sem luva a próstata do Fachin, em plena sabatina. Dez horas de humilhação. Mas vento que venta pra lá... Uma delação premiada saiu pela culatra: propinas para caixa 2 na reeleição de Bato Racha. Não invadiram a casa do espancador para apreender obras de arte. Afinal, convenhamos, são todos “artistas” medíocres.
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Fonte - Blog do Miro  01/06/2015

sexta-feira, 1 de maio de 2015

Eduardo Cunha e ruralistas atropelam votação e impõem retrocessos em projeto sobre biodiversidade

Política


Sob o comando do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os ruralistas atropelaram no plenário da casa, na noite de segunda (27/4), a votação do Projeto de Lei (PL) 7.735, impondo uma série de retrocessos para povos indígenas e comunidades tradicionais em relação ao texto vindo do Senado.


Revista Amazônia
Proposta aprovada por deputados retrocede em relação a avanços conquistados no Senado em favor dos direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais. Projeto segue agora à sanção presidencial
Sob o comando do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), os ruralistas atropelaram no plenário da casa, na noite de segunda (27/4), a votação do Projeto de Lei (PL) 7.735, impondo uma série de retrocessos para povos indígenas e comunidades tradicionais em relação ao texto vindo do Senado. O projeto segue agora à sanção presidencial. A proposta trata do acesso aos recursos genéticos e conhecimentos tradicionais associados à biodiversidade e agrobiodiversidade.
Das 23 alterações feitas pelos Senado, em geral com o propósito de mitigar os prejuízos para os direitos de povos indígenas e tradicionais estabelecidos no texto original da Câmara, só 12 foram acolhidas pelo relator Alceu Moreira (PMDB-RS). Ele também foi o autor da redação inicial aprovada na Câmara e enviada ao Senado, em fevereiro.
O novo parecer do deputado foi aprovado na íntegra por um acordo fechado entre líderes ruralistas, o lobby do agronegócio e das indústrias de cosméticos, medicamentos, higiene e alimentação. Uma tabela elaborada pelo grupo foi distribuída ao relator e demais parlamentares para orientar a votação. Com exceção de uma emenda, rejeitada de última hora por Moreira, o resultado da votação foi idêntico ao previsto no documento (veja foto abaixo). Mais uma vez, a articulação política do governo – agora sob a responsabilidade de um dos principais caciques do PMDB, o vice-presidente Michel Temer – não reagiu.
As emendas do Senado foram votadas uma a uma, por aclamação. Na maioria das votações, PSOL, PV, PT, PSB e PcdoB votaram a favor delas e, consequentemente, a favor dos direitos de povos indígenas e tradicionais. Os outros partidos fecharam questão na defesa do parecer de Alceu Moreira. A liderança do governo liberou a bancada em quase todas as votações.
Como fez várias vezes desde que assumiu a Presidência da Câmara, no início do ano, Cunha foi decisivo, imprimindo seu ritmo às votações, impedindo que os parlamentares tivessem mais tempo para analisar as emendas e aprofundassem a discussão. O relatório de Moreira ficou pronto no final da tarde de segunda e muitos parlamentares só tomaram conhecimento de seu conteúdo durante a leitura do documento, em plenário, no início da noite. A votação pode ser considerada mais uma demonstração de força de Cunha frente ao governo.

Retrocessos
“Tudo o que melhorou a lei foi aceito. Só não aceitamos o que era impraticável.
Havia emendas parcialmente boas, mas seria impossível aproveitá-las”, justificou Moreira. Ele voltou a negar que povos indígenas e tradicionais foram excluídos do debate sobre o processo, como denunciam organizações da sociedade civil e movimentos sociais e já foi reconhecido pelo governo.
Entre elas, foi mantida a proibição de que empresas estrangeiras sem vínculo com instituições nacionais de pesquisa obtenham autorização para acesso ou remessa ao exterior de patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado. Também foi mantida a proposta do Senado que prevê que, no caso de produtos desenvolvidos no Brasil com base em recursos e conhecimentos de outros países, só haverá isenção de repartição de benefícios, após a vigência da lei, para produtos de alimentação e agricultura. O texto original da Câmara previa uma isenção para todo tipo de produto, o que fere a Convenção da Diversidade Biológica. (leia mais no box abaixo).
“O que está sendo discutido nesta casa é como ganhar mais dinheiro e abrir o país ao capital estrangeiro. O que o projeto pretende é abrir as áreas indígenas e de agricultores familiares aos interesses do agronegócio. O projeto é para grandes negócios, não para defender direitos”, criticou o deputado Ivan Valente (PT-SP).
A assessora do ISA Nurit Bensusan analisa que, assim como povos e comunidades tradicionais, a indústria também saiu perdendo com a nova lei. “As empresas passaram esse tempo todo reclamando que não havia segurança jurídica para esse tema no país, e agora concebem e apoiam uma nova lei que trará muito mais insegurança jurídica e que já traz em seu bojo, por causa do seu processo de aprovação, um enorme potencial de conflito com os detentores de conhecimento tradicional”, comenta.

Lobby
Epresentantes das grandes indústrias e do agronegócio conduziram diretamente as negociações que resultaram no parecer de Alceu Moreira. Fizeram parte das conversas integrantes da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e da Coalizão Empresarial pela Biodiversidade, coordenada pelo Grupo FarmaBrasil (leia mais no box abaixo).
Em nota, a CNI “considera a aprovação da lei de acesso ao patrimônio genético um marco para as pesquisas e para o desenvolvimento de produtos de uso sustentável no Brasil”. A instituição não atendeu ao pedido de entrevista feito pelo ISA.
Mais uma vez, lobistas da indústria tiveram acesso privilegiado ao plenário, o que provocou reclamações de vários parlamentares. Como na primeira votação na Câmara, a diretora do Grupo FarmaBrasil, Adriana Diaféria, assessorou diretamente Alceu Moreira em plenário. Ela também não atendeu aos pedidos de entrevista do ISA até o fechamento desta reportagem.

Como ficou o texto aprovado pela Câmara
§Foi mantida a redação original da Câmara pela qual são isentos de repartição de benefício os produtos derivados de acesso ao patrimônio genético realizado antes de 29 de junho de 2000.
§O texto aprovado exclui o conhecimento tradicional de origem identificável da possibilidade de acordo setorial destinado a reduzir o percentual do valor da repartição de benefícios derivada da exploração econômica de um produto.
§Segundo o texto aprovado, os órgãos oficiais de defesa dos povos indígenas e comunidades tradicionais não serão obrigatoriamente ouvidos no caso de um acordo setorial para reduzir o percentual do valor da repartição de benefícios de um produto desenvolvido a partir de recurso genético ou conhecimento tradicional de origem não identificada. A redação menciona que esses órgãos apenas “poderão” ser ouvidos.
§Foi mantido o termo “agricultor familiar” na definição de “agricultor tradicional”. Ainda assim, o texto como um todo garante que qualquer pessoa que utiliza variedades ou raças tradicionais crioulas ou localmente adaptadas, inclusive grandes produtores rurais, seja alvo de repartição de benefícios.
§Foi excluída do projeto a previsão de criação um centro de assistência para os povos indígenas, comunidades tradicionais e agricultores familiares, instância de assessoramento aos os detentores de conhecimento tradicional.
§Foi mantida a menção à Lei de Proteção de Cultivares (Lei nº 9.456/1997) e ao Sistema Nacional de Sementes e Mudas (Lei nº 10.711/2003). Essa vinculação limita os direitos das comunidades porque o Ministério da Agricultura define hoje as variedades crioulas, sem a participação do Ministério do Desenvolvimento Agrário.
§Em caso de acesso a patrimônio genético na modalidade não monetária, a repartic¸a~o de benefícios não será mais destinada a Terras Indígenas, territórios quilombolas, unidades de conservação e áreas prioritárias para a conservação. As empresas usuárias definirão a destinação do benefício.
§O Ministério do Meio Ambiente (MMA) não conseguiu manter no projeto sua principal bandeira: a de conferir ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) a atribuição de fiscalizar o acesso e exploração dos recursos genéticos e conhecimentos tradicionais junto com o Ministério da Agricultura.

Veja como ficou a redação final do PL encaminhado à presidenta Dilma Rousseff


Saiba quem faz parte da Coalizão Empresarial pela Biodiversidade
§Grupo Farmabrasil
§Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC)
§Associação Brasileira das Indústrias de Produtos de Limpeza e Afins (ABIPLA)
§Associação Brasileira da Indústria de Química Fina, Biotecnologia e suas Especialidades (ABIFINA)
§Associação Brasileira da Indústria Química (ABIQUIM)
§Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais (ALANAC)
§Associação Brasileira das Empresas do Setor Fitoterápico, Suplemento Alimentar e de Promoção da Saúde (ABIFISA)
§Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (ABIA)
§Movimento Empresarial pela Biodiversidade (MEBB)
§Instituto Ethos
Fonte - Revista Amazônia  30/04/2015


quarta-feira, 8 de abril de 2015

Câmara aprova volta da escravidão

Política


Durante todo o dia, os parlamentares de esquerda tentaram evitar a votação do projeto de lei (PL) de número 4330 que libera geral a terceirização no país. Mas o presidente da Câmara Federal, o lobista Eduardo Cunha, fez jus às doações privadas da sua campanha e abortou as obstruções, derrotando os dois requerimentos que pediam o adiamento da sessão.

Por Altamiro Borges
Às 21h14 desta quarta-feira (8), a Agência Brasil deu uma trágica notícia: "A Câmara dos Deputados acaba de aprovar, por 324 votos a favor, 137 contra e duas abstenções, o texto principal do projeto de lei que trata da regulamentação do trabalho terceirizado. Os destaques e sugestões de alterações serão discutidos na próxima semana". Na prática, os deputados aprovaram a volta da escravidão ao Brasil. Com a terceirização das chamadas atividades-fim, o assalariado não terá mais os direitos garantidos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e terá ainda maiores dificuldade para se organizar em sindicatos na luta contra o desemprego, o arrocho salarial e a precarização. Já a sociedade como um todo sofrerá com os péssimos serviços prestados pelas terceirizadas.
Durante todo o dia, os parlamentares de esquerda tentaram evitar a votação do projeto de lei (PL) de número 4330 que libera geral a terceirização no país. Mas o presidente da Câmara Federal, o lobista Eduardo Cunha, fez jus às doações privadas da sua campanha e abortou as obstruções, derrotando os dois requerimentos que pediam o adiamento da sessão. Diante da derrota histórica dos trabalhadores, as bancadas mais à esquerda pensam agora em ingressar com uma ação de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF). Há ainda a hipótese da presidenta Dilma Rousseff vetar o projeto, comprando o debate de ideias na sociedade sobre o grave retrocesso deste projeto de lei.
A votação final do PL-4330, prevista para a próxima semana, deve radicalizar ainda mais a postura do sindicalismo. Nesta semana ocorreram vários atos no país contra a barbárie da terceirização. Em Brasília, houve confronto com a polícia, acionada pelo fascistóide Eduardo Cunha. A mídia privada - nos dois sentidos da palavra - tentou desqualificar as manifestações sindicais. Os barões da mídia, que demitem centenas de jornalistas, apostam todas as suas fichas na libertinagem da terceirização. O sindicalismo precisará intensificar ainda sua pressão para desmascarar este projeto e seu mentores. Já circula a proposta de organizar uma greve nacional contra a volta da escravidão ao Brasil.
Fonte - Blog do Miro  08/04/2015

sábado, 21 de março de 2015

A corrupção nos tempos da ditadura

Política

Por Paulo Fonteles Filho, em seu blog:

Na atualidade, os áulicos da direita promovem raivosa cruzada contra as forças progressistas e, patrocinados pela mídia conservadora, trombeteiam que o período ditatorial fora pródigo no combate à corrupção e aos corruptos. Acontece que, com os poderes Legislativos e Judiciários aviltados como instrumentos de fiscalização e punição, a perversão dos recursos públicos e as transgressões do poder aumentaram exponencialmente no período mais sangrento do Regime Militar.
É mais que sabido que a malversação dos recursos que pertencem a toda a sociedade não decorre apenas de graves falhas individuais, mas, sobretudo, têm em suas raízes as causas de seu tempo e os aspectos políticos, econômicos, sociais, culturais e ideológicos que demarcam e tipificam cada regime político. A sangria e o desmazelo com o que é público, ou seja, de toda a sociedade, se desenvolvem de acordo com as peculiaridades de cada regime e, fundamentalmente estão ligados à quadra histórica dessas experiências.
No país tupiniquim a corrupção sempre esteve presente e alcançou dimensões gigantescas durante mais de vinte anos de Regime Militar, evento histórico marcado pela censura, assassinatos, torturas, exílios, entrega das riquezas nacionais e desaparecimentos forçados.
Mas o alcance da corrupção também teve, em seus horizontes, aquilo que ensina a historiadora Herloisa Starling, na medida em que ela “ (...) se inscreve na natureza do regime militar também na sua associação com a tortura – o máximo de corrupção de nossa natureza humana. A prática da tortura política não foi fruto das ações incidentais de personalidades desequilibradas, e nessa constatação reside o escândalo e a dor. A existência da tortura não surgiu na história desse regime nem como algo que escapou ao controle, nem como efeito não controlado de uma guerra que se desenrolou apenas nos porões da ditadura, em momentos restritos.
Ao se materializar sob a forma de política de Estado durante a ditadura, em especial entre 1969 e 1977, a tortura se tornou inseparável da corrupção. Uma se sustentava na outra. O regime militar elevou o torturador à condição de intocável: promoções convencionais, gratificações salariais e até recompensa pública foram garantidas aos integrantes do aparelho de repressão política. Caso exemplar: a concessão da Medalha do Pacificador ao delegado Sérgio Paranhos Fleury (1933-1979)”.
A corrupção assegurou aos torturadores, além da cumplicidade, a legitimação de seus resultados porque, para a tortura funcionar é decisivo que na máquina judiciária existam servidores públicos dispostos a dar legalidade a processos estapafúrdios, confissões falsas, laudos periciais forjados e autópsias fraudadas. Ainda, na miríade da mais covarde das violências, nunca haveremos de esquecer o financiamento de todo esse processo cruento, notadamente realizado por grandes empresários, como Boillensen, sempre dispostos em fornecer dotações extra-orçamentárias para que a máquina da repressão política estivesse sempre azeitada para triturar opositores. Com base nesse tipo de financiamento é que surgiram o fenômeno dos grupos de extermínio, como a Scuderia Le Coq, de São Paulo.
Um dos aspectos para o agravamento da corrupção, seja na máquina de suplício instalada, seja pela roubalheira - termo chulo que explica - foi à redoma protetora sob a qual, os generais e seus aliados civis exerceram o poder no Brasil.
O fato é que as decisões mais importantes da nacionalidade e dos destinos de todos os brasileiros passaram a ser de competência exclusivíssima de um seleto grupo de militares, políticos, grandes empresários e burocratas que, com todos os canais de respiração da vida democrática açodados, atuaram, também, para transferir as riquezas produzidas pelos trabalhadores brasileiros para as mãos de bem poucos, sejam eles nacionais ou estrangeiros.
Ocorre que a imprensa, mesmo os apoiadores de primeira hora da quartelada de 64 como é o caso da Folha de São Paulo, fora submetida à censura durante anos e, no momento em que a ditadura experimentava seu período mais ufanista, cuja propaganda revelava um crescimento econômico de 10% ao ano no curso do sanguinário governo de Garrastazu Médici (1969-1974), desconfiar e fiscalizar os governantes, exigir prestações de contas e indicar abusos na administração estatal era considerado crime contra a ‘segurança nacional’, passível às mãos de febrentos verdugos.
No entanto, com a distensão política do regime no período do governo Geisel (1974-1979), as ‘tenebrosas transações’, como ensina o samba libertário de Chico Buarque de Holanda, vieram à tona e a opinião pública começou a perceber qual o feitio dos dirigentes brasileiros de então. Porém, mesmo depois de iniciado o processo de ‘abertura’ do governo Figueiredo (1979-1985), a fiscalização social sobre o poder público permaneceu indubitavelmente limitada.
O curso dos anos indicou que o Regime Militar promoveu um conjunto de reformas nos poderes Legislativo e Judiciário no sentido de que tais esferas se domesticassem e, inofensivas, jamais poderiam atuar enquanto instrumentos de fiscalização ou mesmo promover a punição dos representantes do poder estatal ou da iniciativa privada flagrados em atos lesivos aos interesses coletivos.
Não obstante às crescentes denúncias, que estouraram a partir de 1974, o número de pessoas punidas e de casos esclarecidos foi absolutamente pequeno, assim como nenhum integrante do alto escalão do poder fora punido, mesmo diante de escândalos de alta-voltagem como o da Capemi (Caixa de Pecúlio dos Militares), que ganhou concorrência suspeita para a exploração de madeiras nobres no Pará, além dos desvios da ponte Rio-Nitéroi e da Rodovia Transamazônica.
Importante indicador das medidas ‘defensivas’ estabelecidas pelo regime despótico, que ensejaram tranqüila desenvoltura de seus próceres pelo submundo das negociatas e irregularidades administrativas é o número de requerimentos para a constituição de Comissões Parlamentares de Inquérito encaminhados à mesa da Câmara dos Deputados até 1968, crescentes, mas que, com a Reforma Constitucional de outubro de 1969, promovida pela Junta Militar que sucedeu Costa e Silva (1967-1969) determinou seriíssimas restrições aos instrumentos legais de investigação parlamentar.
Além disso, com a edição do Ato Institucional n° 5 (AI-5), em dezembro de 1968, o Congresso sofreu inúmeras cassações contra parlamentares atuantes e dispostos, mesmo nas limitadas condições da minoria oposicionista, em enfrentar o regime tirano. Assim, depois de mais de duas décadas de intensa atividade investigativa, entre 1946 até 1968, a Câmara dos Deputados ficou os anos do ‘milagre brasileiro’ (1969-1972) sem instalar sequer uma CPI.
Somente após 1975 é que a Câmara retoma, timidamente, seu papel investigativo, sobretudo depois da vitória do MDB no pleito de 1974: uma CPI para apurar irregularidades no Instituto Nacional de Previdência Social (INPS).
Apenas em 1980, entretanto, é que foi aprovada uma CPI requerida pela oposição, o famoso caso Lutfalla, envolvendo o então governador paulista, Paulo Maluf. O escândalo - investigado pela Comissão Geral de Inquéritos (CGI), instrumento criado pelo Poder Executivo - girava em torno de empréstimos realizados pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDE) as empresas de Maluf, em crise falimentar.
O embaraço principal para os mais estreludos generais era o fato de que aquele ex-governador, reconhecidamente corrupto, se utilizava de enorme influência junto aos militares para emplacar interesses obscuros.
As obstruções governistas e as manobras regimentais, próprias da luta parlamentar, não foram os únicos fatores de entrave ao pleno funcionamento das CPI’s, seja no caso Lutfalla, seja em outros.
Em alguns casos, quando militares foram convocados para prestar depoimentos, estes se recusaram a dar qualquer informação relevante, como o ocorrido com o coronel Raimundo Saraiva, que depôs na CPI da Dívida Externa de 1983. O caso, esquecido no curso de mais de trinta anos, indicava o envolvimento do ministro Delfim Netto em transações irregulares com banqueiros franceses. Naqueles dias o coronel Saraiva era embaixador do governo Geisel em Paris.
Em outro caso, como o do general Newton Cruz, instado a dar esclarecimentos na CPI da Capemi, lançou mão da legislação que o protegia e não foi depor.
O Poder Judiciário que, em última instância poderia ter sido o instrumento de controle social sobre o poder, os bens e o erário público também sofreu limitações profundas, como foi à reforma do Judiciário de 1977, embutido no chamado Pacote de Abril. O produto do intento, no essencial, fez concentrar a força do judiciário na esfera federal.
O Supremo Tribunal Federal (STF), cujos juízes são nomeados pela Presidência da República aumentou seu poder em prejuízo dos tribunais estaduais e o Procurador Geral da República, representante do Executivo junto ao Judiciário, ampliou as suas atribuições. Qual resultado senão o açodamento do Judiciário e o aviltamento de suas funções? Em última instância, o Pacote de Abril deu ao despotismo militar o poder de interpretar as leis segundo suas conveniências.
Os que conspiraram para depor o governo legítimo de João Goulart (1961-1964), com o apoio a CIA através do Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), assim o fizeram sob o discurso de combater o comunismo e a corrupção. Ocorre que, os homens que tomaram o poder em 1964, utilizaram-se de métodos terroristas para combater qualquer resistência democrática, mas, na luta contra a corrupção, pouco ou nada fizeram.

Referências Bibliográficas:

- AVRITZER; BIGNOTO, GUIMARAES, STARLING (Orgs) Corrupção ensaios e críticas, Editora UFMG, 2008.
- FICO, Carlos. Como eles agiam: os subterrâneos da ditadura militar. Rio de Janeiro: Record, 2001.
- GASPARI, Elio. Coleção As Ilusões Armadas. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.
- RIBEIRO, Renato Janine. A sociedade contra o social: o alto custo da vida pública no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 2000.

* Paulo Fonteles Filho é membro do Grupo de Trabalho Araguaia do Governo Federal e Vice-Presidente do Comitê Paraense pela Verdade, Memória e Justiça.
Fonte - Blog do Miro (Altamiro Borges)  21/03/2015

Protesto dia 15, no DF: desrespeito de motorista não combina com desejo de mudança

Política

créditos: Uirá Lourenço
Mobilize - Colaborador de Brasília registra a falta de civilidade com pedestres e ciclistas no ato de 15 de março.Carros invadiram todos os espaços no ato em Brasília

Autor: Uirá Lourenço
No último dia 15, fui à Esplanada dos Ministérios conferir a manifestação contra a corrupção, marcada para acontecer em diversas cidades brasileiras. Como faço desde junho de 2013, pego a bicicleta e vou até o palco das manifestações observar e participar das mobilizações.
Estava com a esposa na tandem (bicicleta dupla) e a primeira impressão que tivemos foi de que a circulação a pé ou de bicicleta estava bastante comprometida. Então, decidi mudar o foco do registro fotográfico. Em vez de observar cartazes e comportamentos, fui conferir as imediações da Esplanada dos Ministérios.
E o resultado foi desanimador. Carros espalhados por todos os cantos, em qualquer espaço livre, não importando se fosse calçada, canteiro ou ciclovia. Motoristas estacionavam e circulavam tranquilamente por espaços públicos. Ao deixarem os carros para irem à Esplanada, bradavam palavras de ordem contra o governo, cobrando melhorias.


Calçadas e canteiros invadidos. Fotos: Uirá Lourenço
Mais espaços públicos invadidos 
O vídeo a seguir deixa claro o grau de desrespeito, de falta de civilidade com pedestres e ciclistas no ato do dia 15 de março. Prepare-se, as cenas são fortes!



A contradição entre o desejo de mudança e a ação egoísta ao dirigir é evidente. Almejam-se mudanças no governo, mas não se consegue mudar velhos hábitos, como o de dar um jeitinho na hora de estacionar, não importando se a atitude desrespeitosa irá comprometer a segurança e o conforto da coletividade.
Se a alegação para as inúmeras infrações observadas for a suposta falta de vaga para estacionar, então que se repense a forma de se deslocar até as manifestações e se inclua na pauta de reivindicações as necessárias melhorias no transporte coletivo.
No quesito respeito no trânsito e civilidade, definitivamente a culpa não é das estrelas, como se poderia supor pelos adesivos colados em alguns dos carros infratores. A culpa é do cidadão comum que ignora normas básicas de boa convivência.

Fonte - Mobilize  20/03/2015

segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Charlei Hebdo': Somos todos o quê?

Política


Os números da exclusão em marcha no continente (europeu) são suficientes para esfarelar essas ‘uniões’ nascidas da emoção da tragédia, como é o caso, mas que historicamente se mostram insuficientes para regenerar as partes de um todo que já não se encaixava mais.

Por Saul Leblon
No site Carta Maior
O emblema totalizante, ‘somos todos Charlie’, teve curta unanimidade no ambiente trincado de uma Europa onde, de fato, não há lugar para todos serem a mesma coisa em parte alguma.

Os números da exclusão em marcha no continente (europeu) são suficientes para esfarelar essas ‘uniões’ nascidas da emoção da tragédia, como é o caso, mas que historicamente se mostram insuficientes para regenerar as partes de um todo que já não se encaixava mais.

Como recompor o cristal da liberdade, da igualdade e da fraternidade, diante de uma Europa unificada pela lógica do mal estar social?


Com políticas pública que hoje irradiam chantagem, regressão , niilismo, intolerância e medo diante do futuro rarefeito?

Somos todos o quê?

É justo perguntar quando o Estado a serviço dos mercados mastigou todas as pontes para a construção de uma cidadania convergente e soberana.

A polêmica linha de humor do ‘Charlie Hebdo’ deve seu sucesso, em grande parte, justamente à acentuação dessa rachadura em uma chave religiosa.

Deve-se respeitar a sua liberdade. Mas a forma como escolheu exerce-la fez do jornal parte do estilhaçamento que procurava criticar; tornou-se assim mais um referido do que referência.

A Europa tem hoje 8 milhões de imigrantes sem papeis; 120 milhões de pobres e 27 milhões de desempregados.

Após seis anos de arrocho neoliberal, o desemprego e o esfarelamento do padrão de vida dos trabalhadores e da classe média – condensado em uma geração de jovens que dificilmente repetirá a faixa de renda dos pais, turbinou a rejeição ao estrangeiro, criou o medo da 'islamização da sociedade', alimentou a extrema direita e liberou a demência terrorista.

Não necessariamente nessa ordem, mas com essa octanagem abrangente.

A imponente marcha em Paris neste domingo não escapou do liquidificador de nitroglicerina.

Seria irônico , não fosse trágico.

Na comissão de frente da principal coluna da manifestação, que reuniu um milhão de pessoas, ao lado do presidente François Hollande , e de Merkel, lá estava Benjamin Netanyahu.

Sim, o premiê de Israel.

Ele que acaba de se aliar à extrema direita para transformar o Estado israelense em um estado religioso.

Responsável por alguns dos mais impiedosos massacres do século XXI, contra populações civis encurraladas por Israel na Faixa de Gaza, a presença de Netanyahu a engrossar o ‘somos todos Charlie’ convida a pensar sobre o alcance das unanimidades.

É um silogismo barato afirmar que a recusa ao bordão dominante endossa o abismo ensandecido do terrorismo.

Num texto de 1911, ‘Porque os marxistas se opõem ao terrorismo individual’, e quando ainda nem desconfiava que ele próprio seria uma vítima futura, León Trostsky criticou exemplarmente aquilo que, nas suas palavras, ‘mesmo que obtenha "êxito" (e) crie confusão na classe dominante (...) terá vida curta; o estado capitalista não é eliminado; o mecanismo permanece intacto e em funcionamento. Todavia, a desordem que um atentado terrorista produz nas fileiras da classe operária é muito mais profunda. Se para alcançar os objetivos basta armar-se com uma pistola, para que serve esforçar-se na luta de classes? Se um pouco de pólvora e um pedaço de chumbo bastam para perfurar a cabeça de um inimigo, que necessidade há de organizar a classe? Se tem sentido aterrorizar os altos funcionários com o ruído das explosões, que necessidade há de um partido?’, criticava o líder da Revolução de Outubro, banido e assassinado por Stálin, para concluir em seguida: ‘Para nós o terror individual é inadmissível precisamente porque apequena o papel das massas em sua própria consciência e (desvia) seus olhos e esperanças para o grande vingador e libertador, que algum dia virá cumprir sua missão’.

Cento e quatro anos depois, o alerta ganha atualidade diante das medidas cogitadas após o massacre em Paris.

Os indefectíveis Le Pen, pai e filha, pedem, nada menos que a restauração da pena de morte, abolida em 1981.

A nostalgia da guilhotina é só o primeiro degrau do patíbulo.

O endurecimento contra os imigrantes, na verdade, já avançava em marcha batida antes do massacre da quarta-feira (07/01) .

Agora, porém, que ‘somos todos Charlie’, quem irá detê-lo – se até Netanyahu aderiu?

Ofuscados habilmente pelo ‘consenso’, os antecedentes da tormenta esticam o elástico de uma gigantesca armadilha histórica.

Desemprego com deflação e captura do Estado e da política pela alta finança.

É disso que se trata a tragédia europeia, vista de corpo inteiro.

A zona do euro enfrenta deflação recessiva; a Itália tem desemprego recorde; Alemanha e França assistem a uma espiral de xenófobia; Grécia tem 59% da juventude fora do mercado; Portugal tem 500 mil desempregados e Espanha devastou sua rede de proteção social.

Assim por diante.

Foi preciso que um economista moderado, Thomas Piketty, coligisse uma enciclopédia estatística do avanço rentista sobre a riqueza da sociedade para que o tema da desigualdade merecesse algum espaço – fugaz— no debate econômico e midiático sobre a crise europeia.

E mesmo assim colateral às decisões da troika, que estala o relho no lombo da cidadania e exige ordem unida ao abismo.

É sobre essa base de rigidez que a alavanca da tragédia move o curso da história.

Não Maomé, não Charlie Hebdo, não a juventude niilista.

Não os filhos de imigrantes pobres , que se convertem cada vez mais ao islamismo como ponto de fuga à meia cidadania da desordem neoliberal que nada tem a lhes propor hoje.

E não o fará amanhã também.

Entregue aos ajustes fiscais, na ressaca dos mercados após o fastígio neoliberal, a Europa é hoje um museu de lembranças do acolhimento humanitário e político, que a transformaria em legenda da civilização e da fraternidade.

Na Itália, sob o afável Berlusconi, o Estado elevou para seis meses o tempo que imigrantes ilegais podem ser detidos em ‘ centros especiais’ e autorizou a criação de falanges civis para “ajudar a polícia a combater o crime nas ruas”.

Na Grécia, onde as taxas de desemprego triplicaram sob o chicote de Frau Merkel, os integrantes do partido Aurora Dourada sequer dissimulam a inspiração nazista: sua faxina étnica avança contra árabes, africanos, ambulantes, ciganos e homossexuais.

‘Somos todos Charlie’?

As notícias contraditórias que chegam dos EUA, surfando em uma recuperação feita de empregos com salários aviltados, e da Europa sem Estado à altura para reagir, evidenciam a profundidade de uma desordem que não cederá tão cedo, nem tão facilmente.

A consciência dessa longa travessia é um dado fundamental para renovar a ação política em nosso tempo.

Recuos e derrotas acumulados pela esquerda mundial desde os anos 70, sobretudo a colonização de seu arcabouço pelos interditos neoliberais, alargaram os vertedouros ao espraiamento de uma dominância financeira que agora produz manifestações mórbidas em todas as esferas da vida.

Quando a economia se avoca um templo sagrado, dotado de leis próprias, revestido de esférica coerência endógena, avessa ao ruído das ruas, das urnas e das aspirações por cidadania plena, o que sobra à democracia?

A pauta dos mercados autorregulados revelou-se uma fraude.

Gigantesca.

Era o fim da história, replicava o colunismo áulico.

Não era, mostrou setembro de 2008.

Pior que isso.

O sete de janeiro francês avisa que se a sociedade continuar apartada do seu destino, os próximos capítulos serão dramáticos.

No Brasil, os que incitavam o governo a jogar o país ao mar em 2008, retrucam que o custo de não tê-lo afogado na hora certa acarretou custos insustentáveis.

E eles terão que ser pagos agora.

Na forma de um afogamento incondicional.

Recomenda-se vivamente beber a cota do dilúvio desdenhada em 2008 em uma talagada única.

Não há alternativa, diria Margareth Tatcher.

As escolhas intrínsecas a uma repactuação do desenvolvimento brasileiro, de fato, não são singelas.

Nada que se harmonize do dia para a noite.

Por isso, o crucial é erguer linhas de passagem, repactuar metas, ganhos, perdas, salvaguardas e prazos.

Mas há um requisito para isso: tirar a economia do altar sagrado da ortodoxia e expô-la ao debate democrático do qual participem todas as forças sociais.

Quando a mídia conservadora tenta tropicalizar o bordão ‘somos todos Charlie’, seu objetivo mal disfarçado vai no sentido oposto.

Tenta-se reduzir uma tragédia ciclópica a um atentado à liberdade de expressão.

E de forma rudimentar desdobrar a comoção aqui em um veto ao projeto de regulação da mídia brasileira.

Para quê? Justamente para interditar o debate sobre o passo seguinte do desenvolvimento do país.

O apego da emissão conservadora à liberdade de expressão, como se sabe, é relativo.

No dia seguinte ao massacre em Paris, a Folha de São Paulo, por exemplo, dedicou 256 palavras, uma nota de rodapé, para tratar do caso do blogueiro saudita, Raif Baddawi.

Baddawi dirigia o fórum on-line ‘Liberais Sauditas Livres’; foi condenado por isso a dez anos de prisão e multa de US$ 260 mil.

Seu caso é uma referência do padrão de justiça que impera na democrática sociedade saudita, principal aliada dos EUA no mundo árabe, onde mulheres não podem dirigir sequer automóveis e inexiste judiciário independente da vontade dos mandatários.

Além de dez anos de prisão, Baddawi também será punido com mil chibatadas por "insultar o Islã" – 50 por semana, durante 20 semanas.

A primeira cota foi aplicada na última 6ª feira.

Uma nota com 256 palavras foi tudo o que o liberal Baddawi obteve de um dos principais veículos de informação do país.

Compare-se com as cataratas de tinta, imagem e som dedicadas à blogueira cubana Yoani Sánchez que, livre, leve e solta, viajando pelo mundo, mereceu da mesma Folha de SP mais de 90 mil citações; 155 mil no Globo e 110 mil no Estadão.

É difícil imaginar algo do tipo ‘somos todos Baddawi’ alastrando-se pelo colunismo pátrio que dispensou às visitas de Yoani um tratamento de chefe de Estado.

São dois pesos e mil chibatadas.

Uma diferença sugestiva.

Que recomenda cautela com as unanimidades produzidas pela mesma fonte.

Aqui ou em Paris.
Fonte - Blog do Miro  12/01/2015